Organização Criminosa
O conceito da expressão “organização criminosa”
A problemática referente ao conceito da expressão “organização criminosa” no ordenamento brasileiro só foi efetivamente resolvido com o advento da Lei nº 12.694/2012, posteriormente substituído pela definição trazida pela Lei nº 12.850/2013. Apenas com tais leis é que o conceito de organização criminosa foi, de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, inserido no ordenamento jurídico pátrio.
Nesse sentido, é possível afirmar que, hoje, vigora, no País, o conceito de organização criminosa tal qual previsto no art. 1º, § 1º da Lei nº 12.850/2013, segundo o qual “considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional”.
Nota-se de pronto que a norma adotou ipsis litteris o conceito presente na Convenção de Palermo, somente retirando a problemática expressão “existente há algum tempo”. Sendo assim, o Estado brasileiro de uma vez só resolvia o problema da lacuna legal interna como também estava alinhado aos termos do tratado internacional.
Lei 12.850/13
Conforme se observa, muito embora a lei 12.850/13 não faça qualquer referência à eventual revogação parcial da lei 12.694/12, notadamente no que respeita ao conceito de organização criminosa, não se pode admitir a superposição de conceitos em tema de tamanha magnitude. Tal situação, ao nosso ver, deve ser solucionada a luz dos critérios utilizados para a superação do conflito aparente de normas, especialmente, o critério cronológico. Assim, deve-se entender que a lei 12.850/13 revogou, no que tange ao conceito em apreço, a lei 12.694/12, devendo ser utilizado, portanto, a definição naquela prevista.
Ressalte-se, ainda, que a lei 12.850/13 tipifica as condutas de promover, constituir, financiar ou integrar (pessoalmente ou por interposta pessoa) organização criminosa, assim como os comportamentos de impedir ou de qualquer forma embaraçar investigação penal que envolva organização criminosa, punindo tais ações com a mesma pena, ou seja, reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos, e multa.
Prevê a lei 12.850/13 a chamada “colaboração premiada”, dispondo em seu artigo 4º que:
“O juiz poderá, a requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um ou mais dos seguintes resultados:
I – a identificação dos demais coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles praticadas;
II – a revelação da estrutura hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III – a prevenção de infrações penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV – a recuperação total ou parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela organização criminosa;
V – a localização de eventual vítima com a sua integridade física preservada”.
Hipótese de redução de pena ou perdão judicial
Tal hipótese de redução de pena ou perdão judicial não chega a ser novidade no ordenamento jurídico brasileiro, todavia, o §2º do artigo em apreço traz inovação que, a princípio, se afigura como inconstitucional, senão veja-se:
“§2º. Considerando a relevância da colaboração prestada, o Ministério Público, a qualquer tempo, e o delegado de polícia, nos autos do inquérito policial, com a manifestação do Ministério Público, poderão requerer ou representar ao juiz pela concessão de perdão judicial ao colaborador, ainda que esse benefício não tenha sido previsto na proposta inicial, aplicando-se, no que couber, o art. 28 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal)”
Tal possibilidade resta clara ao se analisar o conteúdo do §6º que dispõe que:
“o juiz não participará das negociações realizadas entre as partes para a formalização do acordo de colaboração, que ocorrerá entre o delegado de polícia, o investigado e o defensor, com a manifestação do Ministério Público, ou, conforme o caso, entre o Ministério Público e o investigado ou acusado e seu defensor”.
Assim, de acordo com o texto legal, poderia o delegado de polícia formalizar o acordo de colaboração com o investigado e seu defensor, exigindo-se para tal apenas a “manifestação do Ministério Público”.
Ocorre que, em contradição com o constante em seus parágrafos, o caput do art. 4º faz referência expressa à necessidade do requerimento das partes para a concessão do perdão judicial ou redução da pena aplicada ao agente colaborador e, como é sabido, a autoridade policial não é parte processual, assim e obrigatório a manifestação favorável do Ministério Público.
Mister salientar, que o Ministério Público é o exclusivo legitimado a promover a ação penal pública, somente cabendo a este tanto o oferecimento de denúncia quanto o requerimento de arquivamento do inquérito policial.
Assim conclui-se que e indiscutível a relevância da conceituação de organização criminosa, não somente para fins acadêmicos, mas pelo fato de se ter criado um tipo penal específico para punir os integrantes dessa modalidade de associação.
Sob outro prisma, não se pode escapar da etimologia do termo organização, que evidencia uma estrutura ou um conjunto de partes ou elementos, devidamente ordenado e disposto em bases previamente acertadas, funcionando sempre com um ritmo e uma frequência ponderáveis no cenário prático.
Diante disso, a organização criminosa é a associação de agentes, com caráter estável e duradouro, para o fim de praticar infrações penais, devidamente estruturada em organismo pré-estabelecido, com divisão de tarefas, embora visando ao objetivo comum de alcançar qualquer vantagem ilícita, a ser partilhada entre os seus integrantes.